março 24, 2006

A Bem da Verdade

...a bem da verdade,
poderia começar tudo de novo,
a mesma ilusão traiçoeira,
o mesmo gosto de conhaque,
a velha canção sem enlace...
mas não há outro começo,
o que passou não nos devolve o segredo,
não somos os mesmos,
estamos na arquibancada dos ausentes,
incoerentes como a farsa do gol impedido,
o grito preso na garganta,
o chicote,
a bala instalada nas artérias sem saída,
o peso morto da ilusão de um dia
ter as mãos enlaçadas nas tuas,
a solidão saciada,
a cumplicidade da dor compartilhada,
o motivo para sorrir,
verdadeiro...
a esperança de ver tudo por inteiro,
sem essa mania de fugir da verdade.

Nenhum outro começo sugeriria tanto sonho,
tanta vontade de ir adiante...
derrubar barreiras,
trocar de cidade,
se alimentar de carinho, promessas, instintos...
ser feliz por ser...
sem a marca da vitória social,
mas a nossa marca pessoal.

A alegria pelo entendimento,
o perdão pelo arrependimento
de termos nos descoberto tão depois...
depois da queda dos cabelos,
dos pensamentos ingénuos,
da fertilidade tão desejada,
da nossa vida sem sentido,
por tantas vezes negada...
depois de tanto esforço para se manter em pé
e sempre sozinhos,
carregando no peito
um certo sentimento de impotência,
talvez por um amor tão distante,
que além de inconstante, não é nada disso...


Angela Lara

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